Os direitos que gozamos são o
resultado de um processo longo, difícil e inacabado de muitas lutas:
No século 18, a Revolução Francesa consagra a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão. Dá-se início à consolidação dos direitos civis,
que tornam real a liberdade individual, o direito de ir e vir, de pensar
livremente, de expor o pensamento, de acreditar na religião que preferir, de
assinar contratos, de adquirir e manter bens e o direito à justiça. Para que
esses direitos possam ser respeitados é necessário: (1) que existam pessoas
capazes de defender os interesses dos indivíduos (advogados); (2) que a
sociedade contribua com impostos para que exista uma justiça responsável pela
solução dos conflitos (tribunais) e (3) que os juízes possam tomar suas
decisões sem sofrer nenhuma pressão de pessoas mais ricas ou socialmente mais
importantes.
Desse momento
em diante todos os tipos de luta foram travados para que se ampliasse o
conceito e a prática de cidadania e o mundo ocidental o estendesse para
mulheres, crianças, minorias nacionais, étnicas, sexuais, etárias. Nesse
sentido pode-se afirmar que, na sua acepção mais ampla, cidadania é a expressão
concreta do exercício da democracia.
A partir do século 19, os
direitos civis já não eram mais suficientes para atender as necessidades e
desejos dos cidadãos. Eles passaram a reivindicar o direito de participar
das decisões políticas da sociedade. A eleição é o principal mecanismo pelo
qual esses direitos podem se tornar reais. Mas para que eles possam ser
exercidos é preciso que os candidatos sejam livres para defender suas ideias e
competir o voto dos eleitores com os demais candidatos, e que os eleitores
possam escolher livremente os candidatos que acharem melhor.
No século 20, os direitos
civis e políticos deixaram de ser suficientes. Para que a democracia pudesse se
expandir, era preciso que os cidadãos pudessem também ter direitos que
lhes garantissem o acesso mínimo a um bem-estar físico e material, ou seja, ter
acesso aos direitos sociais. Isso ocorreu porque ficou evidente que não seria
possível a consolidação democrática se parcela significativa da sociedade
continuasse vivendo em situação de necessidade. Como uma pessoa pode exercer o
seu direito ao voto, de forma consciente, se ela não sabe sequer se terá o que
comer amanhã? A luta diária pela sobrevivência não permite aos indivíduos terem
tempo para se preocuparem com questões políticas.
Ser cidadão
é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei: é,
em resumo, ter direitos civis. É
também participar no destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis
e políticos não asseguram a democracia sem os direitos
sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva:
o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice
tranquila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais,
fruto de um longo processo histórico que levou a sociedade ocidental a
conquistar parte desses direitos.
Sonhar
com cidadania plena em uma sociedade pobre, em que o acesso aos bens e serviços
é restrito, seria utópico. Contudo, os avanços da cidadania, se têm a ver com a
riqueza do país e a própria divisão de
riquezas,dependem também da luta e das reivindicações, da ação concreta
dos indivíduos. Afinal, a vida pode ser melhorada com medidas muito simples e
baratas, ao alcance até de pequenas prefeituras, como proibição de venda de
bebidas alcoólicas a partir de certo horário, controle de ruídos, funcionamento
de escolas como centros comunitários no final de semana, opções de lazer em
bairros da periferia, estímulo às manifestações culturais das diferentes
comunidades, e muitas outras. Sem que isso implique abrir mão de uma sociedade
mais justa, igualitária, com menos diferenças sociais, é evidente.
No Brasil, durante os anos
70 e 80, diversas lutas foram travadas com o objetivo de restabelecer a
democracia e ampliar os direitos civis, políticos e sociais da população. Toda
essa luta resultou na Constituição de 1988, chamada por muitos como Constituição Cidadã.